quarta-feira, 16 de junho de 2010

SCUTs - Paga e Cala

Artigo escrito por Mário Ferreira

Dia 1 de Julho entra em vigor a cobrança das scuts, ou pelo menos o governo assim o afirma.

Tendo passado frequentemente na A28, e visto o sistema de leitura previsto, que não é mais do que um pórtico metálico equipado com sensores, surgem as dúvidas sobre como se processará a cobrança.

A realidade é que os referidos pórticos não se encontram colocados sobre as entradas/saídas da A28, mas sim no interior da mesma. Mais ainda, eles são em número reduzido (Apenas a título de exemplo, no trajecto Póvoa-Porto, existe apenas um único pórtico colocado perto da saída de Lavra).

Não existe igualmente qualquer tipo de aviso nos acessos à A28 sobre a existência de cobranças.

Eis então as dúvidas que surgem sobre todo este sistema (e isto esquecendo as questões já muito debatidas sobre a justiça na aplicabilidade das mesmas dado que a zona não cumpre com os requisitos mínimos que o Estado definiu para a aplicabilidade do sistema, em particular os económicos e acima de tudo os do tempo gasto no uso das alternativas). Recorde-se que estas dúvidas não se aplicam apenas a esta estrada, mas à maioria das SCUT que servem o Porto e que irão igualmente passar a ser pagas:


1 - A moralidade de uma cobrança não sinalizada.

Dado o facto de nada ser assinalado, com que moralidade um condutor que entre num troço equipado com pórtico é cobrado, independentemente de possuir chip ou não?

É que como referi, por exemplo no troço Póvoa-Porto, apenas um troço possui o pórtico de cobrança, o que quer dizer que é possível entrar, usar e sair da auto-estrada em outras zonas da mesma, sem que seja aplicada qualquer cobrança. Ora assim sendo não é o uso da A28 que é cobrado, mas sim a passagem naquele pequeno troço em particular, que naturalmente deveria estar sinalizado como cobrado, distinguindo-se assim dos demais onde não é aplicada a cobrança.

2 – A moralidade, da cobrança por igual a quem dá usos diferentes e real custo por KM.

Afirma o governo, numa frase que apenas posso considerar como enganadora e desprovida de verdade que as SCUT irão ser cobradas a uma taxa de 8 cêntimos por km. Tal poderia ser verdade se existisse um controlo efectivo nas entradas, aplicando-se assim o principio tão aplicado em outros locais do utilizador pagador. Mas a realidade é que, não só temos troços não pagos, o que quebra essa regra, como não há controlo sobre o uso efectivo da auto-estrada.

Para explicitar melhor a situação vamos a um exemplo prático, e para tal relembro o que já referi anteriormente sobre a existência de apenas um único pórtico sobre a A28 no trajecto Póvoa-Porto, situado antes da saída para Lavra.

Ora um utilizador que passe sob esse pórtico é cobrado em 1.5€. Fazendo as contas a 8 cêntimos/km, teríamos que cobrar 18,75 km, o que faz com que, cobrando desde a Póvoa, 1,2 Km após a saída de Lavra a estrada passe a gratuita. Usemos então neste exemplo esses pontos como a referência para início e término da zona de cobrança da Auto estrada, dado que eles não são verdadeiramente definidos.

Agora analisemos 2 percursos. Póvoa-Porto e Fajozes-Lavra, em que ambos, por forçarem o condutor a passar sob o pórtico serão debitados do mesmo valor (1.5€) (para quem não conhece, Fajozes fica logo acima de Lavra e antes da Póvoa).

Ora, independentemente do término da zona de cobrança, a realidade é que quem faz Póvoa-Porto pode utilizar 29,5 Km de A28 desde a zona industrial das Cardosas até à Rotunda AIP. Dado os pontos de inicio e término da cobrança não serem definidos até se poderá dizer que para estes o custo real por Km de uso da A28 fica nos 5 cêntimos. No entanto nem pretendo entrar por ai.

A realidade é que quem faz Fajozes-Lavra apenas percorre 5 Km na A28, e é cobrado pelo mesmo valor dado não haver controlo nas entradas. Ora se a matemática não me falha isto são 30 cêntimos/km. E aqui meus amigos não há dúvidas sobre o inicio ou fim das zonas de cobrança. Passou, pagou e não há por onde fugir dado não haverem entradas ou saídas da A28 neste troço. Onde raio ficam então os 8 cêntimos de que o Governo fala? A conclusão que eu chego é que a Scut não é paga, o troço é que é pago e BEM PAGO! Mas se assim é, vamos cair na primeira dúvida já colocada e num preço por km BASTANTE acima do indicado.

3 – O funcionamento do sistema de cobranças

Como é sabido, o sistema irá funcionar através da leitura de um chip. Ora naturalmente, à semelhança do que se passa com a Via Verde, só adquirirá este sistema quem efectivamente necessita dele. Mesmo com a gratuidade do chip, tal não invalida essa situação. Se eu vivo numa zona na qual, na minha vivência normal, não necessito do chip, porque motivo iria eu tratar de instalar um? Aliás nem todos os condutores são Portugueses, há muitos com nacionalidades estrangeiras a circular nas nossas estradas.

Questiono assim se o sistema não criará uma situação discriminatória em que serão debitados os locais que diariamente lá passam, mas ficarão por debitar todos os habitantes de outras zonas do país ou de outros países. É que não há possibilidade de pagamento directo, e assim sendo a questão é bem pertinente. Dia 1 de Julho, milhares de espanhóis irão percorrer a A28, como é habitual, na direcção do IKEA, sem serem cobrados. Assim sendo porque motivo tenho eu de pagar?

4 - A constitucionalidade do sistema de cobrança.

Corrijam-me se estiver enganado, mas a constituição Portuguesa oferece-nos a todos certos direitos e garantias às quais não há que discutir. Ora um desses direitos e garantias é exactamente o direito à privacidade.

Para alem da eventual situação discriminatória que se referiu no ponto 3, que me parece igualmente ser protegida pela constituição, a verdade é que sendo um direito, a privacidade tem de ser mantida.

Se uma privacidade absoluta é impossível de se manter, a forma mais simples e directa de a garantir é através do pagamento em dinheiro: Não ficam nomes, não ficam registos, e como tal há uma efectiva privacidade. Eu posso ter um cartão de débito/crédito e preferir pagar em dinheiro se não quiser registos. Eu posso ter Via Verde e preferir pagar em dinheiro para não ficar o registo. É um direito que nos assiste, garantido na constituição!

Mas e aqui? Passando na portagem fica um registo, e o custo é depois mandado para casa. Se assim é, onde está a minha privacidade garantida, dado que o envelope pode ser aberto por terceiros. E mais ainda, em caso de empréstimo de carros o trajecto é debitado ao dono do veículo e não ao condutor. Onde está garantida a privacidade nesses casos?

Onde está então a alternativa de pagamento que me garante a privacidade.

Há quem diga que há uma forma muito simples de evitar isso, pura e simplesmente não indicando o local de estrada sobre o qual é efectuado o débito. Mas isso não é correcto! Será o mesmo que passar uma multa a alguém sem dizer qual a infracção cometida ou o local onde a cometeu. Quem paga tem direito à descrição completa do que está a pagar, até porque poderá haver motivos para reclamação de algum tipo (estou-me a lembrar do caso de um carro roubado onde se cairia no ridículo de se lhes ter de pagar ainda as portagens).

Fosse como fosse, dado que este tipo de débito indica uma passagem por uma auto-estrada, a privacidade estaria logo invalidada. Poderia não indicar onde se foi, mas indicaria que se saiu da cidade pelo simples olhar para o envelope com os dados de cobrança, estando desde logo quebrada a privacidade, nem que seja parcialmente.

E em caso de extravio da correspondência (o serviço de entrega passa por terceiros)? O que se passará?

E mais ainda, o que impedirá algum brincalhão de se meter a andar para a frente e para trás na portagem passando sob os pórticos?

5 – Que dados possui o chip

Pode parecer ridículo, mas questiono: O chip não pode ser roubado?

Ou não podem existir sistemas de leituras de chips manuais?

Não deveríamos por isso ser informados sobre os dados que o chip contem, e o governo forçado a garantir que o sistema não irá criar situações onde dados confidenciais podem ser furtados. Por exemplo, um telemóvel pode ter muita informação, mas é meu, e sou eu o responsável pelos dados que lá lhe meto. No chip não!

Há muitas, muitas dúvidas por responder, mas o governo permanece inflexível. Dia 1 paga-se!

3 comentários:

  1. Grandes questões que levantas aqui Mário... mas infelizmente muitas continuam ainda por responder. Vamos lá a ver os próximos desenvolvimentos.

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  2. Mais uma vez no nosso país se faz primeiro e se pensa depois. As questões que aqui são levantadas são "pertinentíssimas". Preparem-se para uma avalanche de esclarecimentos/alterações/correcções atrás de esclarecimentos/alterações/correcções de última hora por parte de ministro / secretário de estado / adjunto / chefe de gabinete / motorista / empregada da limpeza, enfim... o costume. :-(

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  3. Bem, segundo informação acabada de chegar, o pórtico em questão entre a póvoa e o Porto apenas cobra 0,95€. Quer isso dizer que os valores para os percursos Póvoa-Porto com 29,5 km de auto-estrada são de aprox. 3 centimos/Km. Para Fajozes-Lavra ficaremos pelos 19 centimos/Km, o que mesmo assim está bem acima dos 8 cm/Km prometidos. Já o Pórtico antes da Póvoa cobra 1,2€ O percurso Estela-Laudos - Póvoa no total de 6.9 Km fica a 17 cêntimos/Km. Volto a perguntar, onde raio estão os 8 cêntimos prometidos.

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