sexta-feira, 16 de janeiro de 2009

Impostos Medievais num Portugal Moderno

Imaginem-se temporariamente na época medieval.


Numa altura de opressão, os lordes feudais dominavam a terra com punho de ferro. Ninguém os ousava enfrentar devido às consequências que os seus actos poderiam ter, com sanções e penalizações diversas.


Uma das regras que vigorava era o pagamento do contributo anual ao lorde. Quem não o pagasse na totalidade, mesmo que por uma diferença de um tostão, seria posteriormente obrigado à fazê-lo, com penalização. Agravando-se ainda o facto de que seria despojado de parte dos seus bens pelo atrevimento de ter desafiado o lorde. E isto para não se falar da possível pena de morte.

Felizmente, já não vivemos na era medieval e este tipo de situações acabou. Foi criada uma Republica gerida por um governo, que se regula por uma Constituição que gere a justiça do País através da garantia de que todos são iguais face à lei; que ninguém pode sofrer dupla penalização pelo mesmo crime e, acima de tudo, gerindo-se pelo principio da proporcionalidade, em que os castigos aplicáveis face ao incumprimento da lei são proporcionais à pena cometida.


Desta forma, roubar um pão deixou de ser um castigo punível com morte ou o decepar do membro considerado como ofensor. Da mesma forma, as penas e penalizações monetárias terão sempre de ser aplicadas de acordo com a ofensa cometida.


Ainda bem que a Republica existe e o nosso governo se rege pela Mui Nobre Constituição Portuguesa!


Mas... será?


É que actualmente continuamos a pagar ao Lorde (leia-se agora Estado) a contribuição anual, na forma de IRS. A diferença é que, supostamente, agora este dinheiro não será para benefício próprio, mas para o bem comum (guardaremos considerações sobre este assunto para outra altura). Acontece ainda que, tal como antes, o não pagamento da divida até uma determinada data tem como consequências a aplicação de penalizações. Até aqui nada de novo, ou de que se discorde!


Para essas penalizações foram inventados os chamados Juros de Mora. Uma forma justa e nada feudal de fazer o estado ressarcir-se. Os juros de mora são juros que se fazem vencer consoante o atraso gerado no pagamento. Mais atraso, mais juros. A intenção da sua criação foi a de ressarcir aquele que possui o direito de receber, de forma a o compensar pelo dano causado pelo atraso no pagamento. Por outras palavras, repor a situação como se o acto danoso não tivesse existido (Os juros de mora são superiores a qualquer rendimento que o dinheiro em causa pudesse ter em investimentos, de forma a garantir que o atraso não é nunca motivo de prejuízo para quem tem a receber).


E é exactamente isso que acontece. Pagamentos atrasados são posteriormente realizados com penalizações elevadíssimas, que podem atingir os 50% do valor inicial em dívida em poucos meses, de forma a repor a justiça e a verdade.


Ora desta forma, criou-se uma forma de ressarcir quem tem o direito a receber (e ao contrário do que se passava com os senhores feudais, aqui todos reconhecemos esse direito ao estado), dos atrasos no pagamento, usando uma medida de acordo com a constituição. Uma penalização de acordo com as regras da proporcionalidade em que os juros são proporcionais ao montante em dívida e ao atraso criado.


Acabou-se foi com a espoliação do pobre do trabalhador que perdia os seus bens ou era mesmo morto pela dívida!


Mas... será que isso é verdade?


Acontece que dívidas mantidas após 31/12 do ano seguinte a que o IRS diz respeito fazem com que haja a perda de benefícios fiscais para esse ano. Uma medida sem dúvida justa para quem deve grandes montantes, mas... e aqueles que devem pouco?

E acima de tudo, como ficamos relativamente aos juros de mora?


A 21/12/2007 mantive - sem saber, dado que os correios não me colocaram as cartas na minha caixa postal - uma dívida ao estado relativa ao IRS de 2006 no valor de 38€. Essa dívida foi posteriormente paga em Março de 2008. Ora aqui, de forma a ressarcir o estado aplicaram-se os chamados juros de mora, que totalizaram 50% do valor em dívida por um atraso de 3 meses.


Pensava eu que, ao serem aplicados juros de mora, estaria a ressarcir o estado como se o facto danoso (a demora no pagamento) não tivesse existido, e a situação estaria resolvida. Não via assim razão para me serem aplicadas mais penalizações dado que, tal a acontecer, estaria a ser penalizado uma segunda vez pelo mesmo incumprimento (algo que também é inconstitucional), mas igualmente porque pelo valor das consequências de uma anulação dos benefícios fiscais, que incluem actualmente uma isenção de IMI, o valor a pagar seria estrondosamente alto quebrando-se toda e qualquer proporcionalidade da pena que o Estado constitucionalmente se vê obrigado a cumprir.


Mas tal efectivamente aconteceu. Tal como o pobre lavrador feudal que se via espoliado dos seus bens, também eu me vi espoliado em mais de 800€, aproximadamente 2105% o valor em dívida, ou seja 21 vezes mais.


Acreditando na justiça escrevi para as finanças locais, as finanças distritais e mesmo para o Ministro das Finanças, de forma a que me explicassem como poderia tal flagrante injustiça e violação da constituição Portuguesa estar a ser praticada por uma entidade do estado que tem como dever reger-se pelo instituído na mesma.
Como seria de esperar nunca recebi respostas, e nada foi feito. O assunto foi enterrado, e eu … que pague (para não usar a palavra começada por f).


Contactado um advogado foi-me dada total razão na minha queixa, mas de forma honesta foi-me dito que apesar da minha razão e de a causa ser uma causa ganha à partida pela flagrante violação dos princípios constitucionais, os custos de uma acção seriam bem superiores aos 800 euros e dai ter-me sido recomendado que pagasse.


É esta a república das bananas que temos. O que me vale no meio disto tudo, comparativamente ao pobre lavrador Feudal, é que aqui estou livre de me virem matar por não ter pago as dívidas a tempo!


... mas será???


Post escrito por Mário Ferreira

7 comentários:

  1. até me doeu ler isto Mário :/ Cambada de xulos... e depois acaba sempre no mesmo buraco sem saída, entre a espada e a parede... Quer fazer valer os seus direitos? Sim senhor, mas vai-lhe custar mais! o_0

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  2. Pá... eu nem critico o advogado. O homem ao menos foi honesto!
    Já não posso dizer o mesmo do estado que nos trata como vermes. Eu nunca deixei de pagar a pequena dívida que tinha, apenas demorei a pagar a mesma e paguei juros de mora elevadíssimos por causa disso. Vir depois "roubar-me" 800 euros só por causa de um atraso é verdadeiramente vergonhoso.

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  3. Acho que é daquelas coisas que: caso tivesse um amigalhaço nas finanças, resolvia-te logo o problema...
    Indo pelo "protocolo", estamos sempre lixados.

    Isto é mesmo *roubar*...

    É inadmissível que com as tecnologias disponíveis hoje em dia, não se possa utilizar também outros métodos de aviso nestas situações. Eu também já tive situações em que nunca recebi uma carta de aviso.
    Devia dar para configurar avisos por email/sms/etc. para estas coisas que depois tanto nos penalizam por causa de meia dúzia de euros.

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  4. não criticava os advogados Mário, mas sim este sistema em que se te queres queixar tens de abrir os cordões à bolsa, mesmo tendo razão. :/

    concordo contigo Carlos em relação aos avisos, era uma coisa fácil de se fazer, mas isso não ia trazer mais dinheiro aos serviços (estado). Sem avisos é que se está bem, que o pessoal não sabe (o pessoal anda sempre mal informado, e se não se informa pelos seus próprios meios come com as multas que é um mimo) e é isso que se quer neste momento, orçamentos de estado que fazem cabimento de verbas de multas. Quando se faz isto a pensar no que se vai receber de multas e juros de multas, etc, alguma coisa vai muito mal, porque não se caminha no sentido de corrigir o que está mal, mas apenas autuar, autuar, autuar e autuar! :/

    eu confesso que já fui beneficiado por causa dessa porcaria de sistema de não sermos avisados. Passou tanto tempo sobre a minha suposta infracção (não devia nada a ninguém, não tinha nada a pagar, mas como não entreguei um papelzinho, pimbas!!! sempre as burocracias) e também sobre a falta de aviso das finanças, que a coisa prescreveu para o meu lado, essencialmente porque não fui avisado, e agora já era tarde demais, até para as finanças me autuarem. Eu andei sempre a adiar, e tive sorte LOL

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  5. Mas agora já não tens essa sorte. Eles agora tem tudo informatizado para não deixarem pasar nada (desde que lhes seja favorável, claro)

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  6. Eu já tive de pagar mais de 120 euros de multa por atraso de alguns dias na entrega da declaração trimestral do IVA. Declaração essa que no meu caso consiste em dizer que nada tenho a pagar de IVA (é tudo facturado a uma empresa comunitária). Lá tive de criar lembretes para evitar q se repita.

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  7. Caramba.
    Brasil e Portugal, qualquer semelhança é mera coincidência. Por aqui pagamos altos impostos e ainda somos penalizados com multas e juros de mora, além do mais, ainda tem os famigerados bancos, que comem a outra parte. (Corveia e Talha). Lembrando que a ocupação lusa no Brasil deu-se após 1500 d.C., não tivemos Feudos aqui, eles aparecem agora. Sustentamos as castas nobres com pesados impostos.

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